Missa de Domingo

Neste sagrado dia de ver a Deus, em que ainda me posso empaturrar pois o jejum do Advento ainda não chegou - continuo sem perceber porque é que o S.Martinho, bom homem e até eleito pelo povo a bispo lá pr'ás bandas de França, no tempo em que a nomenclatura eclesiática ainda mal esboçava as leis canónicas e até os padres podiam casar e ter filhos, é invocado em vez de Baco em dia de comes e bebes, em que o vinho é a referência.

Sem pretender fazer teologia, ou seja, arriscar ajeitar a verdade desconhecida instituindo a mentira - penso que o facto de S.Martinho ser um bom homem que faleceu em 11 de Novembro, passou a ser lembrado em festejos populares onde não faltava o bom vinho naquela região Francesa, ainda por cima uma data que coincide com o periodo da prova do vinho novo, que por lá é quase sempre um pouco mais cedo do que cá. Facto que nos empurra para a água-pé e jeropiga, porque vinho novo e bom não é fácil de encontrar nesta data.

Diga-se que hoje é assim um dia em a Igreja se pode libertar da caracterização "a religião é o ópio do povo" - hoje o ópio é substituido pelo vinho, a pedrada é substituida pela bebedeira. Isto a propósito das dificuldades que os párocos hoje terão nas homilias pela legitima solicitação dos crentes em ouvirem explicações sobre a mediática bronca entre o Papa e os Bispos portugueses. É que não se trata de assunto fácil,- adivinha-se problemas na discussão da Concordata, coisa pesada a envolver negócios chorudos, e talvez alguma dor de corno de Bento XVI, arrependido de não ter participado e inscrito o seu nome na inauguração do faraónico monumento em Fátima. É que os Papas também comem, bebem, mijam e cagam como nós, logo também têm birras de vez em quando.

Tais pensamentos trazem à liça nesta minha "homilia", comentários que recebi por em outro post referir ter amigos crentes defensores da liberdade. Supostamente o mesmo, invocou várias vezes a frase de Marx "a religião é o ópio do povo" procurando demonstrar que ter amigos crentes não é próprio de um revolucionário.

Sem usar o mesmo estilo, apraz-me precisar que o jovem velhudo Marx, pessoa com quem converso muitas vezes, - usou tal frase num contexto especifico e apenas como recurso retórico. Marx odiava e condenava a exploração, condenava a mentira a par da religião como sustentáculo do sistema, mas a sua atitude em relação a este fenómeno foi a de um cientista e não a dum profeta ou moralista. Ele não ambicionava eliminar da história humana as épocas marcadas por esta ou aquela forma de exploração, sistema politico ou religião vigentes, nunca as considerando como um tempo perdido no processo histórico da evolução da humanidade. Usar tal frase daquele jeito, é uma tentação oportunista, própria de um clerical reacionário que a usa como instrumento diabolizador da elaborada concepção materialista da história, como processo inelutável da libertação da Humanidade e do Homem.

As bebedeiras ideológicas, mesmo sem S.Martinho, levaram à destruição dos legitimos sonhos acalentados pela grandiosa revolução de 1917 - foram uma cambada de anti-marxistas, exactamente porque beatos daquele que nunca foi S.Marx, em vez da libertação do homem, criaram um paraiso de merda.

Agora vou comer e beber bom vinho velho e uma pinga de água-pé.
-Que Deus Baco vos cuide!
-Amen!