domingo, março 19, 2006

Contrato primeiro emprego (CPE) : Paris em convulsão social




«Chirac, Villepin, Sarkozy: o vosso periodo de ensaio acabou!!» grita um grupo de estudantes vindos da Sorbonne em direcção ao Quartier Latin... quase 40 anos depois sente-se no ar um cheirinho a Maio de 68. Um cheirinho só, pois agora as premissas e os objectivos são outros... Já não se grita palavras de ordem contra a guerra, já não se pugna por uma maior liberdade sexual, já não se pintam bustos de Marx e Che nos muros das faculdades, não se exige uma alteração das eternas sebentas de ensino marcadas por uma rigidez obscurantista , já não se vê um brilho hippie em “cada esquina”.... Agora luta-se pela estabilidade profissional, agora luta-se pelo direito a um emprego digno, mas uma coisa é certa continua-se a lutar contra a manipulação abusiva vinda dos senhores sentados nas cadeiras do poder.

O CPE passou a ser muito mais do que uma desastrosa medida político-económica, passou a aglutinar a insatisfação social e laboral de uma sociedade. Os jovens fartos de não deterem um rumo concreto na via profissional, fartos de estudarem e especializarem-se para cair ora nas garras do desemprego ora nas mandíbulas do trabalho precário, gritam que a política do governo assenta na premissa: «Calem-se agora, e depois sejam escravos durante 2 anos ou mais».

Aos estudantes e aos jovens, juntaram-se alguns sindicatos, os partidos da oposição de esquerda, os cidadãos anónimos descontentes com a situação politica e/ou solidários com o movimento anti-CPE, em particular. Fala-se agora de uma greve geral caso a dita lei não seja revogada até a próxima segunda-feira....
No meio da manifestação assiste-se ao aparecimento de pseudo manifestações “anti-greve” fruto de associações de extrema-direita habituadas à manipulação de massas anti-grevistas, e o campo de batalha alarga-se, agora começam a surgir tb os jovens dos subúrbios, na sua maioria filhos ou netos de emigrantes, que mais uma vez demonstram o seu descontentamento face a uma sociedade com dois pesos e duas medidas que os vê com desprezo ou medo.

No meio do gás lacrimogéneo grita-se contra uma lei, grita-se contra o sistema injusto. Grita-se em plenos pulmões na esperança de mudar o que lhes foi imposto:
« Não tenhas medo dos cães do sistema: a polícia está cá para nos lixar...Luta, Luta pelos teus direitos” gritava ontem uma jovem, numa reportagem em directo de um canal de noticias inglês, enquanto era arrastada por mais de dois polícias pelas ruas da cidade.

E nós por cá... continuamos à espera de outro Maio de 68 que nos influencie.... continuamos a assinar os nossos recibos verdes com um nó na garganta... “será o último que assino?”... continuamos a tirar senhas nas filas, cada vez maiores, do fundo de desemprego... “o que vou dar de comer amanhã aos meus filhos?”.... “ porque andei a estudar?”... “quando é que vou ter uma casa...será que vou conseguir ter uma casa...??”... “ eu só quero trabalhar.. porque é que não consigo um emprego....” “... porque é que há contratos de um mês? O que vou fazer para o mês que vem?”... “ o que é que eu vou fazer à minha vida?” são estes e outros pensamentos que percorrem a mente de milhares de jovens deste país ... mas continuamos à espera...

E nós por cá...

2 comentários:

Anónimo disse...

É interessante ler as análises de alguns dos habituais fazedores de opinião cá do sitio, aguardo até com alguma expectativa o que a "Gralha de Serviço" vai hoje comentar na RTP1...
Vislumbra-se desde já o velho denominador comum, redutor dos legitimos objectivos da luta encetada pelos Estudantes e Trabalhadores Franceses.
Desde já o enfoque na violência, preparando a generalização de tudo não passar de actos de vandalismo.
A actuação das ditas "forças da ordem" até têm sido comedidas, já escreveram alguns...
Por cá, talvez mais cedo do que tarde, teremos de accionar destas, pois não vai ser possível ao actual governo manter semanalmente com efeitos ilusionistas, tantas aldrabíces enganando o "pagode".

Anónimo disse...

a frança sempre deu o exemplo!
por cá, as coisas vão ficar iguais...a "malta" é muito obediente e respeitadora!
a única coisa que vai mudar são as "forças da ordem" adquirirem muros metálicos (mais de 2 metros de altura e que exigem transporte especial) para copiarem as "autoridades" francesas que, pela primeira vez na europa, usaram este equipamento.....