domingo, maio 11, 2014

Foi um Milagre

Já ía eu para lá de Alcochete, na recta do Porto Alto,
quando me aconteceu um Milagre.
É que uma pessoa desesperada acaba sempre por se agarrar a qualquer coisa - os discursos na televisão e nos jornais não falam de esperança, só repetem promessas a renovar mentiras, ditas pelas habituais elites alternantes na governança, enquanto que  para a família o trabalho não se gasta, sendo a única riqueza que pôe todos a dar graças a Deus, mas o dinheiro não chega para o mês, mesmo fazendo contas em escudos, em que uma carcaça já custa 30 escudos, com os salários já curtos e ainda a encurtar com o fim das Contratações Colectivas.
 
Desesperados, trocou-se o hábito de ir a manifestações, optou-se por peregrinações. Assim lá parti eu na Sexta-feira, com um colete florescente, uma bengalinha muito leve que era do meu pai, uma mochila com a bucha, água, boxers e papel higiénico, e lá ía eu protegido com um bom chapéu à marzantina, oferecido por um romeiro que foi da Moita a Viana na última Romaria.
Parti sózinho, pois a companheira anda arrasca com as arteroses nos joelhos, mas garantiu que manteria uma vela acesa até à volta.
Lá ía eu, com o sol já fugido e a noite a vincar-se, pois depois de uma sesta preferi caminhar pela noite, não me juntando a grupos, fugindo das conversas que só empatam e desiquilibram a respiração a quem tem muito para andar - ía só, quando de repente pela frente de uma Oliveira e a coberto de umas Silvas, surgiu um brilho intenso seguido de uma explosão silenciosa expandindo uma névoa de estrelinhas a extasiar-me de beleza, gerando-me uma sensação de felicidade, uma calma que espanta, pois tendo em conta o inesperado o que seria normal era um valente cagaço - mas ouvi uma voz feminina, de principio pareceu-me até a bonita voz da Ana Bacalhau dos Deolinda, mas não, era uma figura angélica, bonita, quase nua, uma santa, que mesmo despida é sempre virgem e casta, a perguntar-me onde é que eu ía ... Respondendo-lhe ainda engasgado, que ía para Fátima, ao que ela para meu espanto fez um gesto brusco e uma carêta ... Então tu também és daqueles que acreditam que eu apareci áquelas crianças na Cova da Iria? Que ditei três segredos que só os teólogos entendem, a crianças que nem sequer sabiam ler? Que até lhes falei dos hereges da Revolução Bolchevique, e cometi a desumanidade de nem falar dos milhares de portugueses, que nessa altura morriam em Flandres na 1ª Grande Guerra?
Ora amigo, volta mas é para casa, tu que sempre foste solidário, continua a tua luta e não te esqueças de votar bem. Em relação à falta de dinheiro, está descansado, à tua esposa hoje vai-lhe sair dinheiro que dará para compôr o mês.
 
Atordoado com todo o brilho e a força daquelas palavras, dei corda aos sapatos e voltei para trás, não tendo coragem de contar a ninguém. Aquela gente que continuou, muitos com o terço na mão, não acreditariam que ali houvera um milagre e ainda menos que aquele a que dão graças nunca existiu.
Cheguei quase às duas, apaguei a porra da vela cujo cheiro impestava a casa, mas a companheira acordou, dando-me logo a notícia que no café Pampilho saiu-lhe 500 euros numa raspadinha.
 
Mediante tudo isto que me aconteceu, não admito a  ninguém que ponha em causa este milagre, se o fizer estará a pôr em causa todos os dogmas e milagres, exactamente o que fundamenta e alicersa há milénios a Stª Madre Igreja - tal  como ninguém ousa pôr em causa o milagre de São Nuno, milagre que recuperou a visão de um olho a uma crente, vitima de salpico de azeite quando fritava jaquimzinhos. 

1 comentário:

Anónimo disse...

Não posso por em causa tal evento.
É frustrante, mas é assim!
Mas para Moiteiro de Gema a coisa leva água no Bico..!
Não seria um Ovni, um Notívago?
Como não acredito em milagres...Não estarias com os Copos..?
Palavra que essa dos jaquinzinhos deu-me cabo da mona.

Mas vã lá ainda te safaste com 500 PAUS... o que nestes tempos que correm vai mesmo a calhar.
E viva o velho..!
Safira