Nos tempos que correm as questões religiosas ganham um novo fulgor. A velha questão católicos / muçulmanos, agora com “pozinhos”de protestantismo, regressou às lides noticiosas. A isto acrescenta-se as análises de comentadores israelitas; o crescente descontentamento palestiniano; algumas imagens de populações a manifestar o seu descontentamento e o descontrolo está ao virar da esquina.
A invocação de velhos demónios, que na realidade nunca foram exorcizados, apenas semi-adormecidos, provoca os tristes espectáculos que vimos, semi-incrédulos, na televisão. Eis que em pleno Século XXI se grita por uma nova Cruzada, eis que num século em que ainda há tanto por resolver, se volta a reclamar sangue em nome de religiões feitas por homens mas com cada vez menos humanidade.
É nesta arrepiante conjuntura religiosa-politico-cultural que o Papa desfere uma nova machadada nas relações inter-religiosas. Agora o templo de Fátima será exclusivo para católicos excluindo não só outras religiões como também, se a intenção for cumprida à risca, cristãos não católicos. Um templo outrora visitado pelo Dalai Lama, por comitivas Hindus etc; num ambiente de irmandade (tanto quanto possível) diferentes religiões através de comitivas procuravam mostrar respeito pelos diferentes cultos e promover uma maior compreensão. A reacção das comunidades religiosas não católicas é fácil de prever, não vamos assistir a manifestações em frente à “sede” do Vaticano mas as reacções vão surgir noutros trâmites.
Não sou nem católica nem religiosa. Se me tivesse de catalogar seria como o rótulo de agnóstica. Não obstante, as questões religiosas não são, nem devem ser, apenas para crentes e praticantes. Desde que existe o Homem existem cultos e religiões e desde que estas existem somos confrontados com a uma triste realidade: o fanatismo.
Não estou a afirmar que todos que são crentes e praticantes são fanáticos. Claro que não e ainda bem. Mas o facto é que os diferentes graus de intolerância religiosa estão não só muito bem disseminados como estão gradualmente a aumentar de poder. Não podemos esconder as nossas cabeças na areia, temos de conseguir analisar e avaliar os factos para não cairmos sempre nos mesmos erros. A História não é um ciclo vicioso perante o qual a humanidade flúi desgraçadamente. Se os erros se repetem não é destino: é incapacidade, é insanidade, é ganância, é ignorância, é arrogância... é tudo menos inevitabilidade histórica ou cósmica.....
Estamos no Século XXI, e continuamos a ser assolados por fanatismo religiosos e políticos, por xenofobia racial e cultural e por insensibilidade social. Seria de esperar que nos preocupássemos já com outras questões mais iminentes do que: que Deus merece mais respeito.... Que tal respeitá-los a todos e mais importante ainda que tal respeitarmo-nos uns aos outros!
Em vez disso temos jornais ligados à extrema-direita a divulgar caricaturas rudes de Maomé sabendo perfeitamente que seriam consideradas insultuosas para as comunidades mulçulmanas; temos um país protestante que manteve o silêncio sobre esta questão durante demasiado tempo e que quando falou acabou por não dizer nada; uma “comunidade” internacional demasiado ávida a apontar o dedo esquecendo-se de que não está completamente isenta nestas questões cultural-religiosas, antes pelo contrário. E agora assistimos a caricaturas sobre o Holocausto; a entrevistas radiofónicas em que o ex-embaixador do Irão na Polónia afirma que o numero de vitimas do nazismo não será assim tão grande devido à capacidade dos fornos crematórios!?!?!.... As manifestações de populações muçulmanas sobem de tom e o governo da Dinamarca já ordenou que os habitantes dinamarqueses residentes em países como a Indonésia, abandonassem de imediato esse território devido a questões de segurança. Em “ resposta” às caricaturas sobre o Holocausto surgem caricaturas sobre a população iraniana num jornal Alemão e a questão não vai ficar por aqui.
Verificamos que o fanatismo está de regresso à “ribalta” e que na realidade é necessário muito pouco para que tal aconteça. Verificamos que ele, nos seus múltiplos graus e versões não está longe, anda, inclusivamente, connosco na rua...
Num só dia durante a jornada diária dos transportes ouvi opiniões de arrepiar os cabelos. Uma senhora de idade, referindo-se à população muçulmana: “nunca confiei nessa gente, são uns infiéis, uns sarracenos* deviam de ser todos escorraçados” (?), por seu turno um senhor refere que: “no tempo de Salazar é que era bom” (?!?!?!?), um rapaz responde quero lá saber do Maomé, que merda nunca mais dava as notícias sobre a bola (!!!) e os comentários prosseguiram.
De salientar um comentário de uma senhora durante a travessia do Tejo: “ depois admiram-se das manifestações daqueles rapazinhos no Martim Moniz” devo de confessar que “me passei” virei me par trás e num tom severo disse: “aqueles rapazinhos como a senhora diz são neo-nazis, sabe!? Professam ódio e intolerância, não são melhores do que qualquer outro fanático e chama-los rapazinhos é o mesmo que chamar peixinho a uma piranha” posto isto voltei me para a frente … passado alguns segundos, e muito baixinho, surge o seguinte comentário da dita senhora para a amiga “ deve ser muçulmana”....
Não só continua a existir fanatismo, como a incompreensão social perante situações que não nos afectam no imediato.
Será necessário ser judeu para condenar o holocausto? Será necessário ser muçulmano para ficarmos indignados com os insultos à sua religião? Será necessário estar geograficamente perto das manifestações violentas para compreender as premissas que se escondem por detrás de um arremesso de uma pedra contra uma embaixada ocidental, de qualquer potência europeia ex-colonizadora? Etc., etc.
NÃO! Basta apenas sermos humanos dotados do mínimo que se pode pedir a uma pessoa: indignação perante o sofrimento dos seus pares, sejam eles brancos, negros ou azuis ; estejam ao nosso lado ou a milhas de distância, professem a mesma religião ou não …. São seres vivos e deveriam ter automaticamente direito ao respeito e à solidariedade.
Estamos no Século XXI…. Ou talvez não….
* Denote-se que sarracenos é uma expressão (consideravelmente detentora de um cariz depreciativo) secular utilizada para denominar o povo Árabe. Expressão que adquiriu uma maior divulgação durante ao período de ocupação Muçulmana da Península Ibérica.
4 comentários:
Excelente Alley Cat.
Um grande abreijo ;)
Por isso é que prefiro ser Agnóstico.
http://oblogdanalga.blogspot.com/
http://blogdobrocas.blogspot.com/2006/02/1111-explicao-precisa-se.html
Bom escrito, elevada consciência. Basta pacientemente somar as boas vontades para num qualquer dia destes o mundo ficar diferente, ficar à dimensão da humanidade em equilibrio com a natureza, com chatíces, mas nenhuma do tamanho do ódio.
Pelo meu perfil, observado ao espelho, penso ser descendente de Árabes, porventura de alguns daqueles que não poderam fugir, por não ter burro ou cavalo quando Henrique veio por aí abaixo.
Hoje não me incomoda ser descendente de Sarracenos, mas em África no tempo da guerra, sentia raiva, quando os brancos tratavam os negros por Nharros.
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